sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Sobre riso, pessoas e academia

12 de agosto é dia da Revolta de Búzios. Era para ser uma data forte na Bahia. Passa despercebido. Meu eterno Grupo de Pesquisa, o Comunidades Virtuais, falou dele em linguagem de Games, mas talvez nem tanta gente sabe o que foi. Durante meus seis anos de professora da rede municipal de Salvador, a data era quase uma obrigação histórica, esquecida durante o ano e renascida das cinzas no mês de agosto. Mas não é sobre isso esse texto, post, essa conversa. Ou talvez seja...
Dia 12 de agosto, especialmente o de 2010, foi quando recomeçou o semestre de aulas regulares do doutorado na FACED/UFBA. Seria mais um dia, mas na minha vida acadêmica, nenhum primeiro dia é apenas um dia. E tem sido assim, curiosamente, desde que me entendo por ser aprendente. Não foi diferente dessa vez.
Era uma disciplina pela qual tinha brigado pela vaga. Brigado no sentido literal do termo, contudo, felizmente ou infelizmente, sem ir às vias de fato.Confesso que brigado muito mais pelo dia e horário dessa turma do que por qualquer outra coisa, mas confesso que devia ser a tal da Conspiração Universal que tanta gente fala. Há de ser, como diz Vercilo.
A aula começava às 8h, mas obviamente que, mesmo saindo de casa às 7h, se é preciso enfrentar boa parte da Av. Paralela, significa que a saída já está atrasada. Chego às 8h30. A sala lotada de rostos conhecidos, recém colega de trabalho, a vibrante Hildonice; Sandra Nívea, a espetacular militante e das mulheres mais mulheres que já vi; minhas companheiras GECianas, Maristela, a responsável pelas dicas tecnológicas e Salete de cabelo novíssimo; e Sérgio, queridíssimo, mesmo que talvez sem saber. Os outros colegas eram rostos desconhecidos conhecidos. No topo da mesa, lá na cabeceira, lugar de gente importante, ela: a professora.
A aula, ou melhor, o ENCONTRO, como EXIGIU que chamassemos os momentos destinados à Projeto de Tese II, começava com os seguintes versos: Andei buscando esse dia/ pelos humildes caminhos/onde se escondem as coisas/que trazem felicidade:/os amuletos dos grilos/e os trevos de quatro folhas.../Só achei flor de saudade. Ah! Cecília! Uma das minhas preferidas, tem gosto de infância....
Imediatamente a pressa, as rugas da testa, a sensação de 'o que será que vai ser essa disciplina', deram lugar ao riso, palavra que minha 'professora' gosta muito, tanto que a insere em uma disciplina chamada O Riso no Currículo. Penso: Se começou com Cecília, já gostei.
Ela, a professora, achou pouco, trouxe Paulo Mendes Campos, sem falar em Chico, Drummond e tantos outros que passeavam com suas palavras. Esqueci da 'ementa oficial' e pensei: vou deleitar-me às quintas pela manhã. Entre Bakhtin, Netto Machado, Osório Marques, flanavam as canções, os poemas, as datas e os olhares.
Falávamos pouco de nós, embebecidos com seus relatos, experiências, dicas, alívio, 'paciência e não apressamento'. Faziámos trincas até com quem não estava, tamanha a certeza de que tudo daria certo e tamanha a ciência das reciprocidades que construímos. Entre uma fala, um texto, uma leitura, uma imagem, um sorriso, falava-se dos 'encarnados e desencarnados', dos presentes e ausentes. O ausente mor: Tico, Luis Felipe Serpa. Se não conhecia Tico, conheço seu nome, sobretudo, o sobrenome de longa data. Um sobrenome que diz apenas no soar e juntar das letras.
Cida, a qual ainda não havia citado, mas que chamava atenção pelo belo vermelho que vestia e colocava nas orelhas, pergunta:
 -Serpa de...'Serpa'?
Um sonoro  'é', meio que óbivo ecoa. E ela continua.
- Ouvi falar muito do professor Serpa e li coisas dele. Ele é fantástico.
Todos nós, concordavamos com as falas de Cida. E de tanto falar da ausência previamente avisada de Tico, ela junta o Tico e o Teco (mas não o mesmo Tico), quase dando curto e pergunta a professora que já havia an passant (palavra que Claudia já havia usado) falado da perda do marido:
- Serpa era o seu marido?
Um riso cúmplice ao  'não' da Marynha (como os mais íntimos chamam minha nova professora) soou-se e Cida, separando o Tico e Teco, diz:
-Ah!! Pensei...
- Não!! Imagina! Sou Arapiraca, de José Arapiraca - dizia Maryíssima, como diz minha espivitada amiga Luciene.
- Teve muitas mulheres, né, Marynha? Mas você não foi uma delas - disse Hil.
- Nãooo! Imagina!! Continuava ela...
E eu que pensava, 'como ela preserva a memória do marido e do próprio Serpa', a ouvi continuar:
- De jeito nenhum, ele era muito velho prá mim.
Riso geral.
Que bom que, talvez inspirada pelos militantes da Revolta do dia 12, briguei para estar nesta turma. Que bom ter conhecido o blog de Mary, que bom fazer parte deste grupo.

E foi assim, tal qual Búzios, que se fez a Revolução no meu pensar os Encontros do Doutorado. Que maravilha é ter junto às Cecílias, Clarices, Anas Maria, uma Maryssima, Arapiraca, obviamente!